31/05/2021 • • por Andre Massaro

Investimentos ESG – Pra valer ou “pra Inglês ver”?


A sigla ESG vem se tornando bastante presente no mundo dos investimentos nos últimos tempos, onde investidores e o público em geral cobram, das empresas, uma postura mais “socialmente e ambientalmente responsável”.

Mas até que ponto o investimento ESG é uma coisa séria (que representa uma preocupação legítima das empresas) ou apenas mais uma jogadinha de marketing para que as empresas se apresentem, perante o público, como “entidades responsáveis”?

O que é ESG

Vamos começar com as definições básicas.

ESG é uma sigla, em Inglês, que significa “environmental, social and governance”. Em Português seria “ambiental, social e governança” e cada uma dessas palavras representa aquilo que se chama de “fatores ESG”.

Inclusive, no Brasil, é comum se referir ao ESG como ASG, trocando o E de “environmental” pelo A de “ambiental”.

Pode parecer uma banalidade, mas se você for fazer alguma prova de certificação financeira, é possível que você se depare com a sigla “ASG”, ao invés de ESG.

Mas, enfim, ESG representa os fatores ambientais, sociais e de governança e uma ação ESG é uma ação de uma empresa que, supostamente, adota práticas de negócios que “respeitam” esses fatores.

Assim, podemos supor que uma ação ESG é uma ação de uma empresa mais “responsável”, do ponto de vista ambiental, social e de governança.

E não se fala, somente, em “ações ESG”, mas também em “fundos ESG” (fundos que investem em ações de empresas que, por algum critério, se enquadram nas práticas ESG).

Quais são as premissas e motivações do ESG

Vamos deixar uma coisa bem clara e que não fiquem dúvidas sobre isso: Ser “sustentável” CUSTA CARO.

Para qualquer empresa, é mais barato e cômodo largar seus resíduos “de qualquer jeito”, tratar seus funcionários como lixo, desprezar investidores minoritários e abusar de seus consumidores.

Então, já que as práticas ESG representam um custo adicional, quais seriam as motivações típicas de uma empresa ao aderir a elas?

A primeira motivação é a pressão, dos governos e da sociedade em geral, para que as empresas sejam “entes mais responsáveis”, considerando que a Economia é um sistema complexo e que decisões de negócios podem ter efeitos não previstos de múltiplas ordens, com impactos bem além da própria empresa.

A segunda motivação está associada ao posicionamento dos próprios investidores. Cada vez mais, vem surgindo investidores “ativistas”, mais alinhados com as questões de sustentabilidade, que não focam apenas nos retornos financeiros e que começam a cobrar posturas responsáveis das empresas em que investem.

A terceira motivação seria a postura dos próprios gestores. Os gestores da empresa podem, por convicção pessoal (e sem precisar sofrer pressões externas) tomar a iniciativa de adotar posturas mais sustentáveis.

A quarta motivação seria a “crença” de que a adoção de práticas ESG é benéfica para os negócios, com impactos positivos nos resultados. Segundo algumas teses e estudos, as empresas que adotam práticas ESG tendem a ser mais lucrativas e sólidas que as demais empresas que não “abraçam a causa” (este é um ponto controverso e sobre o qual ainda não há consenso).

E, por fim, a quinta motivação é o ganho de imagem. É quando a empresa adota práticas ESG apenas pelo benefício reputacional, de poder ir a público dizendo que é uma empresa “sustentável” e “responsável”.

Como definir as práticas e critérios ESG?

Um dos grandes problemas atuais das práticas ESG é que não há um “entendimento oficial” de quais sejam elas.

Então, guardadas as devidas proporções, os investimentos ESG são como “alimentos orgânicos”. Não há uma definição clara do que seja um “alimento orgânico” e as empresas que os produzem acabam usando o rótulo “do jeito que bem entenderem”.

Para dar cabo dessa subjetividade no entendimento do que são investimentos ESG, alguns grupos e associações estão tentando desenvolver critérios e códigos padronizados para serem adotados pelas empresas.

Porém, no momento em que estou escrevendo este artigo, ainda não existe um “frameworkuniversalmente aceito sobre o que é ESG e quais os critérios para definir se uma empresa aderiu, de fato, a essas práticas.

Ainda é um “faroeste”, onde as empresas podem sair por aí “se dizendo ESG” conforme sua própria conveniência.

Mas, de todas essas tentativas de se “sistematizar” critérios de ESG, a que mais me agradou, até o momento, foi a do CFA Institute.

O CFA Institute, para quem não conhece, é o órgão que emite aquela que é, provavelmente, a mais prestigiosa certificação financeira do mundo, o CFA (Chartered Financial Analist).

Critérios de ESG segundo o CFA Institute

Abaixo, está um quadro com os fatores ESG, conforme definidos pelo CFA Institute. Trata-se de um “print” tirado do site deles, e farei a tradução na sequência.

Tabela de três colunas, com os fatores ESG (em Inglês) conforme o CFA Institute

Fatores Ambientais

  • Mudanças climáticas e emissão de CO2
  • Poluição do ar e da água
  • Biodiversidade
  • Desmatamento
  • Eficiência energética
  • Gestão de resíduos
  • Escassez de água

Fatores Sociais

  • Satisfação dos consumidores
  • Proteção de dados e privacidade
  • Gênero e diversidade
  • Engajamento de empregados
  • Relações com a comunidade
  • Direitos humanos
  • Padrões trabalhistas

Fatores de Governança

  • Composição do conselho
  • Estrutura do comitê de auditoria
  • Suborno e corrupção
  • Remuneração dos executivos
  • Lobbying
  • Contribuições políticas
  • Canais de denúncia (“whistleblower”)

O grande desafio do ESG

Se você viu a lista de fatores elencados pelo CFA Institute, deve ter notado que ela não define os critérios com clareza – ela apenas define “pontos de atenção”, que devem ser observados pelas empresas.

E isso está associado à maior dificuldade do ESG, que é a MENSURAÇÃO e a INTEGRAÇÃO dos fatores.

A MENSURAÇÃO é, pura e simplesmente, a medida. Por exemplo, um dos fatores ESG é a “satisfação dos consumidores”. Como se mede isso? Pela quantidade de reclamações não atendidas no site Reclame Aqui?

Já a INTEGRAÇÃO é a incorporação do suposto valor gerado pelas práticas ESG aos FUNDAMENTOS e ao preço das ações da empresa.

Esse é um desafio maior ainda… Cada vez mais, as empresas são apoiadas em ativos intangíveis e de difícil precificação. A adoção das práticas ESG e todos os seus supostos benefícios são intangíveis e de difícil (ou impossível) precificação.

Como uma empresa pode saber até que ponto o ESG é economicamente viável para ela?

Afinal, acho que todos concordam que as empresas precisam ser ambientalmente, socialmente e societariamente responsáveis. Mas se essa responsabilidade vier às custas da própria sustentabilidade econômica da empresa, melhor “fechar de vez”…

A minha “implicância” com os investimentos ESG

No título deste artigo, eu fiz uma provocação, perguntando se os investimentos ESG são “pra valer” ou “pra Inglês ver”.

Agora é a hora de eu dar meu “pitaco” no assunto…

E confira este vídeo aqui para entender melhor onde que “a coisa pega”…


Eu ouço falar, quase diariamente, em ações ESG e em fundos ESG. Cada vez mais gestores de investimento se vangloriam de estar levando esses fatores em consideração no processo de seleção de ações – e eu acho isso uma iniciativa nobre (afinal, precisa começar de algum jeito…).

Porém, até o presente momento, eu me reservo o direito ao ceticismo.

Eu vejo poucas empresas adotando o ESG de uma forma consistente e unificada. O que tenho visto (muito) são empresas adotando ALGUMAS práticas ESG, de forma extremamente pontual, para tentar obter algum ganho de imagem.

Isso acontece, especialmente, naqueles aspectos que são de grande visibilidade e “sensibilidade” junto ao público e às autoridades, como temas de meio ambiente e de diversidade (que, reitero, são muito importantes).

Porém, eu vejo muitas empresas fazendo um “teatrinho” com essas coisas. Algo que poderia ser definido como um verdadeiro “marketing da lacração” com esses temais de maior visibilidade, enquanto ignoram completamente coisas menos visíveis e de menor apelo midiático, como respeito ao consumidor, respeito aos direitos dos próprios funcionários, respeito aos dados e privacidade dos clientes e respeito aos acionistas minoritários.

TUDO ISSO está contemplado na lista do CFA Institute e de outros órgãos que tentam definir os critérios dos investimentos ESG.

Na minha modestíssima visão, ESG ainda é, em grande parte, “pra Inglês ver”. E eu tenho um “termômetro pessoal” que vai me dizer quando essa minha percepção vai mudar e eu vou começar a levar isso a sério: Spam.

Sim, isso mesmo – o bom e velho SPAM.

Spam está associado a privacidade e proteção de dados. E existem, pelo menos, três empresas brasileiras, que se “gabam” de suas práticas ESG, que me mandam spam incessantemente.

Eu NUNCA me cadastrei na base de dados dessas empresas e já pedi, inúmeras vezes, para ser descadastrado (sem sucesso). Em alguns casos, já fiz reclamações formais a órgãos de defesa do consumidor…e nada.

Então, a minha visão pessoal é que eu não reconheço “ESG pela metade”. Enquanto as empresas continuarem praticando “ESG seletivo” (de forma pontual, só naquilo que convém), eu manterei minha posição de que ESG é conversa fiada e “marketing de lacração”, para fazerem bonito junto ao público.

Eu me reservo o direito de só considerar como “ação ESG” a ação de uma empresa que abrace o “pacote todo”, incluindo respeito ao consumidor, aos trabalhadores, à privacidade e ao acionista minoritário.

Esta é a minha posição no momento… E meu email, meu telefone e minha caixa de entrada de SMSs me dirão quando é a hora de, enfim, mudar de ideia…

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