11/07/2020 • • por Andre Massaro

As regras para a mesada dos filhos


Antes de começar este artigo, quero dar um aviso: Eu não tenho filhos, então, nunca senti na pele (provavelmente jamais sentirei) o que é dar mesada. A angústia de definir valores e estabelecer regras para a mesada dos filhos é algo que eu só vivenciei como expectador ou, no máximo, há muitas décadas, quando eu estava do lado “recebedor” da mesada.

Mas eu acho importante fazer essa observação pois, atualmente, muitas pessoas gostam de desqualificar opiniões de especialistas (sim, eu sou um especialista em finanças, entre outras coisas) dizendo que eles não têm a “pele em jogo” (“skin in the game”, para ficar bem metido…).

Bem, se você acha que o fato de não ter filhos me desqualifica para opinar, quero dizer também que eu nunca comi cocô e nunca me joguei do 10º andar de algum prédio. Isso, por acaso, me desqualifica para dizer que essas duas coisas não são boas?

E neste site eu falo de assuntos como falência (nunca fali), endividamento (nunca devi um centavo sequer na vida) e investimentos e negócios que eu nunca fiz e jamais farei. Bem, se eu não estiver qualificado para falar sobre coisas que nunca vivenciei “na pele”, acho melhor eu tirar este site do ar…

Mas, enfim, vamos tratar de um dos assuntos mais controversos do mundo das finanças pessoais, que é a mesada para os filhos.

É necessário dar mesada?

A resposta simples e direta é: Não, não é necessário dar mesada. Alguns pais podem optar por dar dinheiro aos filhos de forma pontual e “conforme a demanda”.

Porém, ao agir dessa forma, esses pais podem estar abrindo mão de uma das melhores ferramentas educacionais para ensinar os filhos a viverem de forma organizada. Pois a mesada é, antes de qualquer coisa, exatamente isso: Uma ferramenta educacional.

As vantagens de dar mesada

Na nossa sociedade, a maior parte dos eventos financeiros (tanto recebimentos quanto pagamentos) é organizada numa base mensal. Salários e comissões são, tipicamente, definidos em valores mensais e pagos nessa periodicidade. Despesas e contas diversas também – a maioria é mensal.

A principal vantagem da mesada é, então, o fato de já ir acostumando a criança a viver do jeito que o mundo funciona, que é “mês a mês”.

Mas existem inúmeras outras vantagens da mesada, a seguir:

A mesada reproduz um “salário”

Isso está em linha com o que foi falado anteriormente (que a vida financeira é organizada em uma base, majoritariamente, mensal).

Quando a criança chegar à idade adulta, é grande a possibilidade de que ela vá se dedicar a alguma atividade profissional cuja remuneração será mensal (um emprego, por exemplo). A mesada, neste caso, já vai fazer com que a criança se adapte a esse ciclo de meses.

A mesada incentiva o planejamento

Uma vez que a criança (ou adolescente) compreenda essa questão do “ciclo mensal”, ela poderá começar a fazer planos e terá, até mesmo de forma natural e intuitiva, contato com o conceito de “orçamento”.

O orçamento nada mais é que o planejamento financeiro projetado para o futuro. Planejamos nossas ações futuras baseadas em nossos padrões atuais de recebimentos e gastos de dinheiro.

A mesada incentiva a cultura de poupança

O hábito de poupar é, praticamente, uma consequência natural do hábito de planejar as finanças e fazer orçamentos.

Entendendo a questão dos ciclos mensais e a importância do planejamento, a criança rapidamente entenderá que, se quiser ter mais dinheiro “lá na frente”, precisará guardar um pouco agora.

A mesada ensina que as coisas custam

A mesada ensina, às crianças, outro importantíssimo conceito: Que as coisas não caem do céu.

Na vida, não se obtém algo a troco de nada. Tudo tem um custo e esse custo é representado pelo dinheiro. Assim como ela (a criança) precisa de dinheiro para fazer o que ela quer, as outras pessoas também precisam de dinheiro.

E, assim, o dinheiro circula numa cadeia em que, supostamente, um está gerando valor para o outro.

A partir de quando dar mesada

Os especialistas em educação e desenvolvimento cognitivo (neste caso, não sou eu…) dizem que as crianças começam a ter as primeiras noções sobre finanças por volta de sete anos de idade. Então, qualquer ação de educação financeira deve começar por volta dessa fase.

A mesada deve ir “evoluindo” ao longo do tempo. Nesta fase inicial (por volta dos sete anos), os valores devem ser pequenos, pois as necessidades são igualmente pequenas e as crianças têm uma tendência natural a perder o dinheiro (particularmente quando dado em sua forma física – notas e moedas).

Com o tempo, as necessidades de dinheiro (e o discernimento para lidar com ele) vão aumentando, e o valor da mesada deve ir aumentando de forma correspondente, até que a criança (aí já não mais uma criança, mas sim um “jovem adulto”) atinja algum grau de independência financeira.

A “pergunta do milhão”: Quanto dar de mesada?

Essa é uma situação daquelas em que “cada caso é um caso”.

Não existe valor determinado para dar de mesada, especialmente quando as crianças já estão um pouco mais crescidas (ou na adolescência).

Nas fases iniciais (ao redor dos sete anos, quando as necessidades e desejos da criança se resumem a comprar algum brinquedo ou algum doce no parque), dar algumas dezenas de reais pode “fazer o serviço”. Porém, à medida que a criança cresce, a mesada vai ser determinada pelas possibilidades e pelo padrão de vida da família.

E, aqui, é o momento de lembrarmos que o mundo não é um lugar justo. As pessoas nascem em circunstâncias diferentes e têm padrões de vida diferentes.

Alguns adolescentes, de famílias mais abastadas, têm mesadas que podem ser maiores que o salário de muitos pais de família. É assim, sempre foi e sempre será. E questões de justiça social estão fora do escopo deste artigo.

Então, não há um “valor certo” para dar de mesada. O valor vai da realidade de cada família – de suas possibilidades financeiras, de seu padrão de vida e de que tipo de educação e valores pessoais se quer passar.

Uma dica geral seria que, dentro do que for definido como um padrão adequado para a idade, se dê uma quantia que seja grande o suficiente para que a criança ou adolescente não se sinta “punida” (isso pode levar, em idade adulta, à uma mentalidade de escassez), mas não tão grande a ponto de incentivar comportamentos irresponsáveis ou criar adultos “molengas” e acomodados no futuro.

Agora, se um adolescente vai ganhar uma mesada igual ao salário do gerente de uma multinacional e um Porsche quando fizer dezoito anos de idade, isso é uma decisão da família. Se isso estiver alinhado com as possibilidades financeiras, o padrão de vida e os valores culturais da família, não há nada a dizer e não há nenhum julgamento a ser feito.

Cada um cuida do próprio rabo…

O uso da mesada (e do dinheiro) como recompensa

Para finalizar, este talvez seja o tema mais controverso entre os especialistas em educação e desenvolvimento infantil: Se a mesada deve estar condicionada a alguma coisa ou não.

Aqui, aparentemente, não há consenso. Mas uma boa parte dos especialistas diz que NÃO se deve associar mesada com desempenho escolar.

Sem ter muito “conhecimento de causa”, eu tendo a concordar com essa visão. O estudo não é um “trabalho” e nem um “sacrifício” – é algo que a criança faz para aumentar suas chances de sucesso em idade adulta.

E, por mais que seja difícil fazer uma criança entender que estudar “é bom para ela”, é preciso não incentivar a ideia de que estudo é uma coisa ruim e que deve ser recompensada. Pelo contrário, a gente não RECEBE para estudar – a gente PAGA.

Se a criança associar o estudo com uma coisa ruim (e que deva ser recompensada), isso pode ter consequências sérias no futuro, gerando adultos apáticos e medíocres, sem interesses intelectuais e no próprio desenvolvimento.

Outra prática comum (e igualmente controversa) é usar o dinheiro como recompensa por tarefas domésticas e por ajudar em coisas rotineiras do lar.

Cuidar da manutenção do lar e das tarefas domésticas é o mínimo que podemos fazer para viver de uma forma decente. No futuro, a criança terá que fazer essas coisas por si só ou, pior, vai ter que pagar para alguém fazer. Então, talvez seja interessante ela já ir se acostumando com a ideia de que a gente não RECEBE pelo privilégio de viver num lugar limpo e organizado… A gente PAGA.

Mas, enfim, a decisão (e os riscos) de usar o dinheiro (de forma geral) e a mesada como recompensa é de cada família. Apenas fica a recomendação de que, se forem fazer isso, que façam de forma criteriosa e sensata, para não criarem “pequenos mercenários” que crescerão acreditando que tudo na vida deve ser recompensado em dinheiro.

Conclusão

Como vimos neste artigo, não há fórmula pronta para definir as regras da mesada. A única coisa importante é que existam regras (senão, “vira zona”). Mas essas regras devem ser definidas pela própria família, e não serem impostas “de fora para dentro”.

A única coisa que a família precisa ter em mente é que a mesada (ou qualquer outra forma usada para dar dinheiro aos filhos) terá uma importância muito grande naquilo que a criança vai virar, quando chegar em idade adulta.

Por isso, a família precisa ter regras muito criteriosas, pois TUDO aquilo que for definido agora terá consequências no futuro.

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