14/01/2021 • • por Andre Massaro

Uma introdução aos derivativos


Os chamados derivativos financeiros representam um conjunto de temas mais avançado no mundo das finanças e dos investimentos, e costumam dar um “nó na cabeça” de estudantes e investidores.

Neste artigo, vamos ver o que são os derivativos e para que servem.

Mas, antes, quero apenas dizer uma coisa a respeito dessa “intimidação” que eles causam nos estudantes de finanças e investidores:

Os derivativos não são, exatamente, “difíceis” de entender. O problema é que eles são uma “coisa diferente”.

É difícil entender os derivativos se a pessoa estiver “com cabeça de investidora em ações”. Os derivativos financeiros são um “mundinho à parte” no universo das finanças.

A definição de derivativo

Um derivativo é considerado, do ponto de vista formal, um “ativo financeiro”. Mas do ponto de vista conceitual, não é.

Um derivativo financeiro é um CONTRATO entre partes (tipicamente duas) que usa um ATIVO (que pode ser financeiro ou não) como REFERÊNCIA DE PREÇO.

Daí vem o nome “derivativo”, que significa algo que “deriva de um ativo”.

E é importante entender essa questão de que o derivativo NÃO É um ativo, pois um ativo é uma coisa que, presumidamente, “existe”. Um ativo (mesmo se tratando de um ativo intangível) é uma coisa que tem existência e que não é “criada do nada”.

Já um derivativo pode SIM ser criado “do nada”.

Para tentar dar um exemplo mais concreto, imagine o ouro.

O ouro é um ativo. Ele “existe” e você pode tocá-lo. E existe uma determinada quantidade de ouro no mundo.

E, a não ser que você seja um alquimista moderno que consiga “transmutar” metais, a quantidade de ouro do mundo é finita.

Mas você pode criar quantos CONTRATOS baseados em ouro você quiser.

Você está lendo este artigo de graça, sem nenhum custo para você. Mas imagine que eu cobrasse um determinado valor para as pessoas acessarem meu site. E esse valor seria o equivalente a UM GRAMA de ouro (conforme o preço do ouro negociado na bolsa de valores).

Eu não tenho nada de ouro comigo… e nem você (eu acho…). Mas, ainda assim, fizemos um “contrato” BASEADO NO OURO!

Este nosso contrato não tem nada a ver com ouro, mas escolhemos o preço do ouro como referência de valor em nossa transação. Então, este nosso contrato (que, hipoteticamente, te permite acessar e consumir o conteúdo do meu site) DERIVA do ouro.

E, da mesma forma que fizemos esse contrato hipotético, milhões de pessoas mundo afora podem fazer contratos e transações baseadas no ouro, sem terem um grama sequer desse metal.

A quantidade de contratos e transações baseadas em ouro é potencialmente infinita. Já o ouro (que é um ativo) é finito.

Entendeu?

O que é um “ativo subjacente”

“Ativo subjacente” é o nome que se dá ao ativo que funciona como referência de preços para o derivativo (é o ativo do qual o derivativo “deriva”).

Tecnicamente falando, qualquer coisa que tenha valor financeiro pode ser usada como o ATIVO SUBJACENTE de um derivativo financeiro.

Nós podemos fazer um contrato (mais um…) onde eu vou te prestar determinado serviço, e a remuneração desse serviço será o valor de um Fusca ano 1982 conforme a tabela FIPE do dia do pagamento (eu não tenho um Fusca… por acaso você tem?).

Porém, tipicamente, os derivativos são criados baseados em ativos FINANCEIROS, como moedas, ações, commodities e em alguns indicadores financeiros, como índices de bolsas e taxas de juros.

Esses são os ativos subjacentes mais comuns, e a maioria dos derivativos é baseada neles.

Os tipos de derivativos

No mercado brasileiro, os derivativos mais comuns são os contratos futuros, as opções, os swaps e os contratos a termo.

Contratos futuros

Os contratos futuros são os derivativos mais tradicionais e, de certa forma, formam o “modelo básico” dos derivativos.

Um contrato futuro é um contrato onde duas partes (um vendedor e um comprador) combinam a compra de determinado ativo, em determinada quantidade, em determinada data e por determinado preço.

Então, imagine que fazemos um contrato em que eu me comprometo a comprar o seu Fusca 1982, azul calcinha e com bola de caranguejo no câmbio, por 10 mil reais daqui 30 dias.

Observe um detalhe importante: NÃO É uma “compra antecipada” (onde eu te dou o dinheiro agora para receber o carro depois). É um ACORDO de que eu vou comprar o carro, naquela data e naquele valor.

Se, na data de efetivação da transação, seu Fusca estiver valendo 20 mil reais, sorte minha e azar seu. Você vai ter que me vender por 10 mil, pois o contrato de obriga a isso.

Por outro lado, se estiver valendo 5 mil…

O que eu descrevi é um contrato futuro. Mas o verdadeiro “encanto” dos contratos futuros é que, no mercado financeiro, a maioria desses contratos são transações PURAMENTE FINANCEIRAS, onde o ativo não é, efetivamente, entregue.

Se faz aquilo que se chama de “liquidação financeira” (por diferença). Ou seja, você não precisa me entregar seu Fusca. A gente acerta pela diferença financeira. Se seu Fusca (que combinamos que valia 10 mil reais) estiver 12 mil daqui 30 dias, você me paga dois mil. Se estiver oito mil, eu te pago os dois mil da diferença…

Alguns contratos futuros têm aquilo que se chama de “liquidação física” (em que o ativo deve ser entregue). Mas a maioria dos contratos, mundo afora, são liquidados por diferença financeira.

Então, nos mercados futuros (onde os contratos futuros são negociados), é possível fazer transações sem precisar colocar o dinheiro “na frente”. Apenas se acerta a diferença no final (no vencimento do contrato).

O que as bolsas de valores (que negociam contratos futuros) pedem é que se deposite um valor, para servir de MARGEM DE GARANTIA, para assegurar que as partes que fizeram o contrato tenham os recursos para acertar essas diferenças.

E podem existir tantos contratos futuros quanto as pessoas interessadas quiserem fazer, de qualquer ativo subjacente.

A quantidade de contratos futuros não é limitada à quantidade de ativos, pois os ativos são apenas a referência de valor para se “acertar as diferenças” quando chegar o dia do vencimento.

Opções

Opções são, como os contratos futuros, um tipo de contrato.

A diferença mais marcante é que não é um contrato que obriga o comprador a comprar o ativo ou pagar a diferença a menor (diferentemente do contrato futuro, onde essa obrigação existe).

No caso das opções, quem detém a opção tem o DIREITO, mas não o DEVER, de realizar a transação prevista naquele contrato (que pode ser uma compra ou uma venda).

Um exemplo “não financeiro” de opção é a compra de um imóvel com sinal. Você paga um sinal (um pequeno valor, em relação à transação) para ter o direito de comprar aquele imóvel por determinado preço. Se você desistir da compra, aquele valor é perdido (mas você não é obrigado a comprar).

Esse “sinal”, no jargão dos derivativos, é chamado de “prêmio”. Então, o prêmio é o que se paga para ter o direito de “fazer alguma coisa” ou, dependendo do lado que você está na transação, o valor que você recebe por permitir que alguém tenha o direito de fazer “alguma coisa” com você.

Imagine que um amigo seu passe por crises ocasionais de raiva, e ele precisa descontar em alguém.

Ele te faz a seguinte proposta: “Te pago mil reais para ter o direito de chutar a sua bunda nos próximos 30 dias”.

E você pensa “uhmmm… por que não?”. Você recebe mil reais e, se seu amigo não passar por nenhum episódio de raiva nos próximos 30 dias, você fica com a grana… Sem precisar fazer nada!

Assim como nos contratos futuros, as opções costumam ser baseadas em ativos financeiros. As opções mais populares são sobre AÇÕES de empresas.

Pessoas, então, compram e vendem, entre si, o DIREITO de comprar ou vender determinada ação (ou outro ativo), por determinado preço e em determinado prazo.

Quem compra uma opção “paga o prêmio” e esse valor é, invariavelmente, perdido.

Mas, dependendo das oscilações de preço do ativo subjacente, essa “perda” do prêmio pode ser largamente compensada pela oportunidade de comprar barato uma coisa que ficou cara…

Swaps

Swap é uma palavra em Inglês que significa, literalmente, “troca”.

No mundo dos derivativos, um swap é uma troca de fluxos financeiros entre duas partes.

Vamos imaginar a seguinte situação: Eu recebo meu dinheiro em dólares e você em reais.

Mas eu tenho que pagar minhas contas em reais. Já você, por outro lado, tem um filho morando nos Estados Unidos e precisa mandar dinheiro para ele todo mês.

Não faria sentido a gente “trocar” esse fluxo financeiro, de forma que você “receba” em dólares e eu em reais?

Neste caso, estabelecemos um valor de referência (pode ser o valor da mesada do seu filho) e fazemos um contrato, em que se o dólar subir, eu te pago o valor correspondente e, se cair, você me paga.

Com isso, nós dois eliminamos o “risco cambial” de nossas vidas.

Contratos de swap são muito comuns, onde agentes financeiros “trocam” fluxos diversos. É possível fazer swaps de variações com moedas, com taxas de juros, com índices de inflação… Basicamente, o céu é o limite.

Uma diferença marcante dos swaps em relação aos contratos futuros e opções é que esses últimos são, tipicamente, negociados em bolsa. Já os swaps podem ser negociados em mercados de balcão (aliás, é bastante comum que swaps sejam “de balcão”).

Contratos a termo

Um contrato a termo é algo muito similar a um contrato futuro.

Uma característica dos contratos futuros é que eles são padronizados (quanto aos ativos subjacentes, aos prazos e às condições gerais).

Já os contratos a termo são mais flexíveis, com as condições sendo negociadas livremente entre as partes.

Outra diferença do mercado a termo em relação ao mercado futuro é que o comprador paga, para o vendedor do contrato a termo, uma taxa de juros pelo período da operação (o que não acontece nos futuros).

No Brasil, são bastante comuns operações com contratos a termo baseados em ações de empresas. Existe, inclusive, um mercado a termo bastante desenvolvido na bolsa brasileira (B3).

Para que os derivativos são usados

Os derivativos são muito versáteis e podem ser usados para muitas finalidades. Mas as finalidades mais comuns são:

Hedge

Hedge é um jargão financeiro em Inglês que significa, literalmente, “cerca”.

Operações de hedge são operações onde se busca a proteção de determinado ativo (daí o nome, que vem de “cercar” o ativo).

Inclusive, os derivativos foram idealizados, originalmente, como instrumentos de proteção, para se fazer um “seguro de preços”.

Para saber mais sobre hedge, leia este artigo: O que é hedge (e como proteger seus investimentos).

Especulação

No mundo dos derivativos, se chama de “especulador” aquele que assume posição oposta àquela pessoa que está buscando a proteção.

O especulador “oferece” a outras pessoas a oportunidade de se protegerem, assumindo para si aquele risco (que as pessoas querem evitar) e, naturalmente, sendo remunerado por isso.

O mercado de derivativos é particularmente atrativo para especuladores por conta da possibilidade de grandes ganhos.

Como não se “coloca dinheiro na frente” (exceto prêmios de opções e margens de garantia) e a maioria das liquidações é por diferença, é possível obter um enorme efeito de alavancagem nas operações, e essa alavancagem amplifica os ganhos (mas também as perdas).

Arbitragem

As operações de arbitragem são aquelas que procuram explorar ineficiências na formação de preços de ativos financeiros.

Às vezes, a relação entre ativos subjacentes e seus derivativos fica um pouco “bagunçada”, e agentes do mercado financeiro podem explorar esses “distúrbios de preços” fazendo as chamadas operações de arbitragem.

Para saber mais sobre arbitragem, leia este artigo: O que é arbitragem (em Economia e Finanças)

Conclusão

Derivativos são um assunto complexo (acho que pouca gente questiona isso).

Porém, “complexo” não é sinônimo de “obscuro” ou “impenetrável”.

O que dificulta o entendimento dos derivativos é que, para quem já estudou as coisas mais “convencionais” de investimentos (como ações e renda fixa), eles podem ser um pouco contraintuitivos.

Por isso, para quem está começando a estudar os derivativos, a minha sugestão é tentar começar com a “mente limpa”. Tentar deixar um pouco de lado aquilo que já foi aprendido sobre ações e outros ativos e adotar a mentalidade de quem está “começando do zero”.

Para quem está estudando, os derivativos não são, necessariamente, uma “evolução” daquilo que já foi estudado. E sim um caminho paralelo.

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