26/05/2020 • , • por Andre Massaro

O que é hedge (e como proteger seus investimentos)


Hedge é uma palavra, em Inglês, que significa, literalmente, “cerca”. Então, sempre que você ouvir que alguém vai “fazer um hedge”, entenda que ela está querendo “cercar” alguma coisa (usualmente um ativo qualquer) para proteger contra riscos.

“Fazer hedge” (alguns gostam de falar da forma aportuguesada “hedgear”) é uma prática de gerenciamento de riscos que consiste em proteger algo.

Hedge e seguros

Uma apólice de seguros é, essencialmente, um hedge (ainda que esse jargão não seja comum fora do mercado financeiro). Porém, nem só de apólices de seguros os hedges são feitos.

No mercado financeiro, hedge costuma ser associado ao uso de instrumentos derivativos para proteção ou, então, assumir posições em alguns instrumentos financeiros que sejam “contrárias” à sua carteira de investimentos, de forma a amortecer, ou mesmo anular, alguns riscos.

Seguros (e, consequentemente, os hedges como um todo) são instrumentos de gerenciamento de risco “pós-fato”. Ou seja, não é uma medida preventiva, e sim algo para ser usado depois que a m…. aconteceu e o risco deixou de ser “risco” para virar um “fato”.

É como o caso de um carro que tenha seguro. O seguro não impede o carro de ser roubado. A probabilidade de acontecer um evento adverso (roubo) em um carro com ou sem seguro é a mesma. Porém, se o carro com seguro for roubado, a companhia de seguro pagará a indenização (pós-fato). O dono do carro terá todo o aborrecimento do roubo, mas a perda financeira será bancada por alguém (que, neste caso, é a companhia seguradora).

No caso dos ativos financeiros, é a mesma coisa. Ter um hedge da sua carteira de investimentos não impede que coisas ruins aconteçam e não impede que sua carteira seja impactada por essas coisas ruins. Mas o hedge compensa (parcial ou totalmente, dependendo do que você fizer) as suas perdas financeiras caso um evento adverso ocorra.

Hedge e diversificação

Tecnicamente, diversificar a carteira de investimentos é uma forma de hedge. Porém, no uso comum do jargão financeiro, é comum se referir ao hedge como “algo além” da diversificação.

Eu mesmo gosto de separar as ferramentas de gestão de riscos de investimentos entre alocação/diversificação (que diz respeito à montagem da carteira de investimentos), o hedge “propriamente dito” (especialmente o uso de derivativos) e mecanismos de limitação de perdas (como as ordens stop loss).

Diversificar investimento é uma coisa bastante fácil e intuitiva de se fazer. TODO investidor deveria diversificar seus investimentos e, mais que isso, a diversificação deveria ser adotada na vida como um todo (diversificar entre fontes de renda, habilidades com valor econômico, conhecimentos etc.).

Por isso, a diversificação (e a alocação, que é a “evolução” da diversificação) deve ser a “primeira linha de defesa” de todo investidor.

De que, exatamente, o hedge protege?

Existem diferentes instrumentos de hedge para diferentes finalidades. Não existe um “hedge contra tudo”, pois os riscos fazem parte da vida. É impossível estar vivo e não estar exposto a algum tipo de risco. Mesmo que você resolva passar o resto da vida escondido debaixo da sua cama, ainda assim sua casa pode pegar fogo ou pode cair um asteroide nela.

Enfim, não há “proteção total”. Ao fazer hedge, você precisa definir, especificamente, de que risco quer se proteger.

Existe um tipo de hedge adequado para cada tipo de risco comum no mercado financeiro, como risco de mercado, risco de crédito, risco cambial, risco de inflação, risco de liquidez e por aí vai.

Quem faz hedge

Os principais “usuários” de hedge são empresas e investidores, de diversos portes e segmentos.

Empresas usam hedge para se protegerem de riscos diversos que possam comprometer suas margens, ou mesmo suas operações.

Imagine, por exemplo, um fabricante de doces. Seu principal insumo é o açúcar (uma commodity agrícola com preço definido em mercados globais – ou seja, não há nenhuma margem para negociação). Agora, imagine que essa empresa tenha um contrato de fornecimento com uma rede de supermercados e, por algum motivo, o preço do açúcar “explode”. A empresa não poderá repassar esse aumento de preços para o supermercado (pois o valor dos doces é definido por contrato).

Se não houver alguma forma de proteção, caso aconteça um evento com essas características, a empresa vai entrar naquela situação de “pagar para trabalhar”, só para honrar o contrato e não sofrer penalidades.

Numa situação como essa, a empresa fabricante de doces tem três opções: A primeira é, simplesmente, assumir o risco para si e “ver no que dá” (é o que boa parte das empresas acaba fazendo). A segunda é comprar, previamente, todo o açúcar necessário para cumprir o fornecimento previsto no contrato. A empresa vai ter que arcar com o custo do açúcar, do armazenamento e o risco de deterioração.

A terceira opção é fazer um” seguro do preço”. A empresa pode, por exemplo, comprar contratos futuros de açúcar (que é um instrumento derivativo). Fazendo isso, a empresa garante para si que terá o açúcar, naquele período, por um preço pré-definido. Ou, então, que receberá a diferença do preço em dinheiro para adquirir o açúcar em condições de mercado.

O objetivo deste artigo não é explicar o funcionamento de instrumentos derivativos, mas, neste momento, o que precisamos ter em mente é que a empresa NÃO precisa comprar o açúcar antecipadamente (evita o desembolso antecipado) e se protege contra a variação de preços (risco de mercado). Porém, se o preço do açúcar se movimentar “a favor” da empresa (caindo), quem paga a diferença é a empresa.

Ou seja, como dizia aquela famosa frase de Milton Friedman, “não existe almoço grátis”. Toda proteção envolve algum tipo de custo ou perda.

Mas, enfim, o exemplo descrito é o hedge “clássico”. Neste caso, um hedge para proteger contra o risco de mercado da variação do preço do açúcar. A empresa passa a ter total previsibilidade do que vai pagar. Se o açúcar subir, ela não será penalizada. Se o açúcar cair, ela não se beneficiará disso.

A maior parte das operações de hedge é, essencialmente, uma variação disso que foi descrito.

Quais as formas de hedge mais populares

O hedge (no contexto das finanças) pode ser feito com ativos financeiros ou com derivativos. O problema de fazer hedge com ativos financeiros é que o custo é maior.

Por exemplo, imagine um fundo de investimentos que quer se proteger da variação do dólar (risco cambial). Uma opção é, simplesmente, pegar uma parte significativa do patrimônio e comprar dólar. Para ter uma proteção efetiva, vai ter que comprar MUITOS dólares, basicamente anulando qualquer outro ganho que não seja a própria variação cambial.

Outra opção é adquirir algum derivativo que seja vinculado ao dólar. Assim, a carteira continuaria tendo o mesmo rendimento, só que “dolarizado”.

Os derivativos comuns, no Brasil, são os contratos futuros (como no exemplo anterior do açúcar), os contratos de opção, os contratos de swap e os contratos a termo.

A vantagem dos derivativos é que não é preciso pagar todo valor daquilo que se pretende proteger. Em geral, o desembolso de um derivativo é o prêmio (no caso da opção) ou um depósito em margem que é uma fração do valor protegido.

O hedge te permite ficar posicionado “ao contrário” da sua posição original, anulando os efeitos das posições. Se você tem uma carteira de ações brasileiras, você está “posicionado” em reais e exposto ao risco do dólar – se o dólar sobe, você perde. Ao assumir uma posição contrária (seja comprando dólares à vista ou através de derivativos), o seu risco, neste caso, passa a ser o real. Fazendo essas duas operações, os riscos cambiais das duas posições se anulam mutuamente. Pronto – você fez um hedge cambial.

Os problemas do hedge

O hedge não é perfeito e existem muitas limitações. E, como foi dito neste artigo, não dá para se proteger contra “tudo”.

Mas são duas as maiores limitações do hedge.

Custo

A primeira limitação é a mais obvia de todas: hedge custa. Toda proteção envolve algum tipo de custo (nem que seja o custo de oportunidade).

Quando investimos numa carteira, ao invés de investir em um único ativo, temos o custo de oportunidade de não colocar todo o dinheiro naquele ativo que vai ter melhor desempenho. Por outro lado, a gente se protege da possibilidade de que aquele ativo, que a gente espera que seja “o grande campeão”, seja um fiasco.

No caso do hedge com ativos, temos o custo do próprio ativo. No caso dos derivativos, cada tipo de derivativo tem suas características e custos. Os contratos de opção têm, assim como as apólices de seguro, um “prêmio”. É um valor que é pago para se ter aquela proteção e não é retornável.

No caso dos contratos futuros, tem o custo de oportunidade (perdemos a oportunidade de ganhar com uma variação positiva de preços) e, ainda por cima, têm os custos de intermediação financeira. O mesmo vale para os swaps e contratos a termo.

Efetividade da proteção

A segunda limitação é que, nem sempre, os instrumentos financeiros são “sob medida” para aquilo que queremos proteger. Às vezes, por limitações do próprio mercado financeiro, só conseguimos fazer hedges “parciais”, por não existirem instrumentos perfeitamente adequados para aquela proteção que se busca.

Um exemplo comum e popular entre investidores é o chamado “seguro de carteira” de ações. O investidor tem uma carteira de ações diversas e faz hedge vendendo contratos futuros (assumindo, assim, uma posição contrária) ou comprando uma opção de venda (uma put, que equivale a uma apólice de seguros típica).

Só que não há um contrato futuro ou opção que replique, exatamente, aquela carteira de ações. Então, o investidor acaba recorrendo a um contrato futuro do Índice Bovespa ou a uma put (opção de venda) de um ETF (Exchange Traded Fund) que replique o Índice Bovespa.

Fica uma proteção meio “capenga”, pois o máximo que o investidor consegue é se equiparar ao Índice Bovespa. Quanto maior a “distância” (o beta, se formos por uma linha mais técnica) que aquela carteira estiver do índice, menos efetivo será o hedge.

Conclusão

Boa parte daquilo que se faz no mercado financeiro não tem, como objetivo, simplesmente “ganhar dinheiro”. Uma parte significativa das operações financeiras são feitas com o objetivo de gerenciar riscos.

Operações de hedge são feitas, corriqueiramente, por empresas de todos os portes e setores. São feitas também por investidores, tanto individuais como institucionais.
E o hedge só é possível pela existência do especulador. O especulador representa, nesse contexto, a figura do “tomador de riscos”.

O risco não vai, simplesmente, “embora” – ele é transferido. Quando você faz um seguro do seu automóvel, você está, tecnicamente, “transferindo” o risco de roubo do seu carro para a seguradora. Se o risco não se concretizar, a seguradora ganha dinheiro. Se o risco virar fato, ela perde dinheiro e você ganha um carro novo.

O especulador faz, no mercado financeiro, o papel da seguradora que, ativamente, “compra” o risco daqueles que querem, por alguma razão, transferi-lo para alguém.
Sem especulador, não existe hedge. Sem hedge, as empresas não conseguem transferir seus riscos e são obrigadas a funcionar de forma pouco eficiente e pouco segura.

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E, para saber mais, leia também: O que é um Hedge Fund

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